publicado por nobilissimavisione | Sábado, 03 Outubro , 2009, 00:39

Há muito tempo que um livro não me irritava tanto. Mas provavelmente sem razão. Os desaparecidos, de Daniel Mendelsohn, que relata um périplo afectivo e geográfico - Austrália, Galícia, Israel, Escandinávia... -, numa busca pelo que sucedeu verdadeiramente aos seus parentes desaparecidos no Holocausto, parece ser mais um volume destinado à família do autor do que ao público em geral. O  narcisismo do autor, a equiparação obsessiva dos seus traços físicos aos dos familiares desparecidos, a exposição (muito americana) sem qualquer pudor dos seus sentimentos (do autor e dos seus irmãos), a omissão de partes da história, em si perfeitamente legítima, mas que o autor nos "esfrega na cara", dando o máximo relevo àquilo que aparentemente pretende resguardar, tornam a leitura desconfortável - no fundo, como se o leitor estivesse a partilhar de algo que não lhe cabe. E a comparação do conflito entre Caim e Abel com a relação entre os judeus e os ucranianos, que é uma das linhas de força do livro, é pretensiosa e (julgo) despropositada, tal como o alongamento artificial da narrativa. Mas a afectuosa caracterização de algumas figuras notáveis - a irónica e comovente Sr.ª Begley, por exemplo -, muito bem conseguida, e a serena descrição da indizível violência, maldade, mesquinhez e paradoxal banalidade das atrocidades que são reveladas na segunda metade do livro, justificam plenamente a sua leitura. O passado é uma pedra com várias faces. Muitas vezes pesada e erodida.

 


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